RESSUSCITOU!

Os discípulos receberam a Boa Notícia da Ressurreição com estas palavras: «Porque buscais entre os mortos aquele que está vivo? Não está aqui: ressuscitou» (Lc 24, 5-6). A cena passa-se junto ao túmulo, que eles encontram vazio. Este mesmo anúncio o recebemos nós, hoje, e todos aqueles que se reúnem em assembleia dominical para a celebração da Páscoa do Senhor: «ressuscitou!» O mesmo anúncio o receberam todos aqueles que nos precederam na caminhada da fé: «ressuscitou!»

A experiência da fé é a experiência da ressurreição, de quem descobre Deus que, morrendo, ressuscitou e está vivo: no Céu, esperando pela nossa chegada, e, aqui na terra, animando e fortalecendo a nossa peregrinação. Esta experiência é sempre de libertação; é sempre o preenchimento do vazio existencial em que, por vezes, andamos mergulhados. A nossa vida é, tantas vezes, aquele baú cheio de frustrações, de nadas, de sem sentido, de dores, de sofrimentos. Humanamente nascemos, crescemos, vivemos e definhamos. Sujeitos às provações do tempo presente, amaldiçoamos, tantas vezes, o nosso destino: sentimos os malefícios do pecado. Escandaliza-nos a guerra, o terrorismo, a violência, a doméstica e todas as demais. O Senhor, ressuscitando, deixou vazio o túmulo onde estivera sepultado para ocupar os túmulos vazios das nossas vidas.

Vivemos, dia após dia, ignorando ou esquecendo ou calando dentro do nosso coração, buscador de sentido, sedento de paz e de Graça, esta Boa Nova: «Porque buscais entre os mortos aquele que está vivo?» (Lc 24, 5). Deus, na nossa vida, quer dar-nos tudo aquilo que o mundo não nos dá porque não o tem para no-lo oferecer: a Palavra, a Verdade, a Vida, a Graça, pois é dada de graça. A vida de Deus em nós preencherá os vazios, todos os recônditos escondidos da nossa alma, os recantos do nosso coração, qual terra seca que absorve os pingos de chuva no Verão. A força da ressurreição inundará tudo, preencherá todos os poros vazios da esponja seca que é a nossa vida.

Contudo, isto não acontecerá de forma espontânea ou automática. Depende do nosso querer; joga-se a nossa liberdade; há lugar para o desejo. Cultivemos o desejo de Deus, que é o desejo de plenitude de vida e de amor. Tolentino Mendonça identifica-o com «o desejo de ser amado, olhado, cuidado e reconhecido» (O Elogio da sede, pg 55). E quando desejamos Deus, «não é o nosso desejo que alcança Deus: se permanecermos sedentos e desiderantes é o próprio Deus que desce à nossa humanidade para encher de plenitude o nosso desejo» (idem pg 54). O salmo 42 cantou de forma expressiva esta sede de Deus: «como o veado anseia pelas correntes das águas, assim minha alma suspira por vós, Senhor»

Se quisermos escutar a Boa Nova da ressurreição, Deus estará presente nas nossa lutas e combates, no nosso trabalho, no modo como usamos os bens deste mundo, no modo como nos relacionamos. O divino irromperá no humano qual fonte de água pura que brota, sem cessar, da montanha e corre para a Eternidade. Como Jesus diz à samaritana: «do seu seio correrão rios para a eternidade» (Jo 4, 14).

Acolhamos esta Boa Nova! Cristo ressuscitou! Aleluia!

O ressuscitado é a vida nova nascida da semente lançada à terra. O Seu corpo morto é, agora, o Seu corpo vivo e ressuscitado. É Ele, o mesmo, com os sinais da paixão, falando e conversando com os discípulos, na sua nova condição de ressuscitado, espiritual, incorruptível, glorioso. E para onde Ele definitivamente se retirou nos levará; aonde Ele está aí nos espera, segundo a promessa cumprida feita a Maria Madalena: «vou partir para meu Deus e vosso Deus, meu Pai e vosso Pai».

A sua ressurreição é a garantia da nossa ressurreição. Como diz a Carta aos Romanos: «todos nós que fomos baptizados em Jesus Cristo fomos baptizados na sua morte. Fomos sepultados com Ele pelo Baptismo na sua morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, também nós vivamos uma vida nova». Se morremos com Cristo, também com Ele viveremos pela ressurreição. Também o nosso corpo mortal ressuscitará para a vida. Seremos nós, com a verdade das nossas vidas, a nossa identidade pessoal. Contudo, seremos espirituais, não sujeitos ao tempo e ao espaço. Seremos nós com a nossa história, portadores do bem ou do mal, do pecado ou da graça, da virtude ou do vício, das boas ou das más acções que tivermos praticado. Será o nosso coração crente ou descrente, comprometido com a paz ou não, vitoriosos ou não no combate da fé até ao fim. Seremos nós, ressuscitados, diante d Ele (o) ressuscitado, chamando-nos pelo nome, como chamou por Maria Madalena na madrugada de Páscoa, para nos abraçar num juízo de misericórdia.

Por isso, irmãos, enquanto peregrinos a caminho dos novos céus e da nova terra, esforcemo-nos por dar cumprimento à recomendação do apóstolo: «aspirai às coias do Alto». Sabemos que para alcançar o alto é preciso subir, escalar a montanha, é preciso esforço, sacrifício, o mesmo é dizer, conversão, na certeza de que receberemos o vinho novo do Reino num coração renovado, purificado interiormente de todo o pecado, pois «os puros de coração verão a Deus».

Nas situações concretas da vida, aspiremos às coisas do Alto. Renunciemos à impiedade; à imoralidade do incumprimento da lei (do amor); renunciemos à amoralidade de quem não tem lei para cumprir; renunciemos à descrença, à indiferença religiosa, à idolatria do dinheiro, à obsessão dos bens materiais, à submissão cega às riquezas, à ganância e ao egoísmo, incapazes de socorrer os pobres lázaros que vivem ao nosso lado. Renunciemos a todas as formas de desrespeito pela vida, de atropelo à dignidade do próximo, nas formas de violência doméstica e não só, na elaboração das leis que não protegem a vida.

Aspiremos às coisas do Alto, pois do Alto nos vem a salvação. Aspiremos às coisas do Alto pela Santidade verdadeira, pela caridade que irradia, qual perfume que inebria, pela esperança de alcançar, pela ressurreição, o Reino preparado para nós desde o princípio do mundo.

P J